n°9

A cova na qual me enterro tem luzes piscantes, buzinas estridentes, sirenes descompassadas e pessoas demais. Todos os dias nos mesmos dois ou três movimentos escovo os dentes, lavo o rosto, escolho uma roupa bonita e, antes de ir trabalhar, deixo que escorram de mim uns pensamentos tristes.
Na minha frente passam velhos caindo aos pedaços e crianças birrentas, homens que me encaram e mulheres que me intimidam.
Todos os dias os mesmos tipos, arrisco até dizer as mesmas pessoas, os mesmos cansaços, lágrimas, vazios. Meus passos viciados me levam aos lugares anotados na agenda, a respiração me lembra que estou viva - e só estou porque soprar esse ar nos meus pulmões não depende de mim.
Eu caminho os passos, escrevo as palavras, faço as rimas que espero de mim, vomito mais meia dúzia de pensamentos pretensiosos que flutuavam na cabeça dos grandes poetas.
Calo-me esses devaneios sombrios pra ver se a luz da ignorância me traz de novo um mínimo de paz.

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